segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Experiências em Philly



Acabei de voltar da Conferência Critical Refusals, na Filadélfia. Organizada pela International Herbert Marcuse Society, não é de se espantar que o clima revolucionário tomou conta de muitas apresentações e discussões. A expressão “tolerância repressiva” foi utilizada muitas vezes para se falar da opressão velada vivida pelos grupos minoritários, sejam mulheres, negros, latinos, homossexuais etc. Mas, a realização de um evento como esse, em uma Universidade privada, nos Estados Unidos, custando caro – e muito caro – não poderia ser caracterizada também como uma espécie de tolerância repressiva?


Há dois tipos de efeito que penso que esse tipo de “tolerância” para com o discurso social – e revolucionário – podem acarretar: um externo e outro interno. O efeito externo – e por externo quero dizer que vai para além dos muros das Universidades – é a representação de certas figuras acadêmicas como líderes ou gurus de um movimento, de uma ideia etc, que reforça a formação de massas lutando “por boas causas”, mas sem a consciência de suas próprias determinações e ações. Veja bem, os movimentos, tais como o “Occupy Wall Street”, nascem de forma independente do pensamento teórico, nascem de uma necessidade prática experienciada por um conjunto da população: não há emprego, não há distribuição igualitária de comida, não há condições mínimas de uma vida socialmente justa. De fora, chegam intelectuais com seus discursos sinceramente brilhantes, que viram, ali, figuras de destaque. O que não se compreende é que a conexão entre teoria e prática tem uma dimensão necessária para além da consciência coisificada. O que falta é a compreensão de como superar essa falsa consciência.


É exatamente nesse ponto que encontro o que chamei de efeito “interno”. A falsa consciência é um fenômeno universal que está também arraigado na alma desses mesmos intelectuais. O discurso brilhante sobre determinados fenômenos sociais, sobre como trabalhar de forma radical buscando a superação das condições desumanas de vida vigentes sob o capitalismo encontra seu revés nas ações inconscientes e espontâneas que deixam transparecer uma visão de mundo centrada na América do Norte. Mesmo quando há o reconhecimento da existência de trabalhos excelentes na “periferia”, a ele se segue o pedido “inocente” de que, por favor, “escrevam em inglês ou traduzam para o inglês seus textos”. Não se dá um passo para fora da zona de conforto, não se dá um passo na direção da tão necessária auto-reflexão crítica. Não estou deixando de reconhecer aqui a importância do diálogo internacional, ao contrário, acredito que um verdadeiro diálogo internacional, principalmente entre pessoas que se autodenominam críticas, deve ser mais do que isso, deve ser cosmopolita.


Mas, essa é apenas uma reflexão crítica sobre uma conferência que foi, de longe, uma das mais impressionantes que participei, seja pela organização e estrutura, seja pelo quanto me senti bem-vinda desde o primeiro e-mail que recebi. São as contradições com as quais a gente tem que conviver, mas as quais a gente não pode deixar de problematizar, com o risco de se tornar cúmplice.


Sobre a minha apresentação, foi bem legal. O Wolfgang estava presente e foi muito bom reencontrá-lo. Também conheci um pessoal bacana do Brasil e no domingo a gente foi dar uma voltinha por Philly, uma cidade muito bonita. Confere aqui.

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